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Um mundo de uvas

Não bastasse a complexidade naturalmente vinculada ao mundo do vinho, em razão do incontável número de informações sobre os mais diversos aspectos do mesmo, que se ligam e interdependem nesta tão agradável “roda viva” do mundo ênico, as coisas podem se complicar já pelo início no confuso rol de uvas, que são, em fim, a essência do vinho.

Trazem algumas publicações a informação de haver mais de 5.000 (cinco mil) castas de uvas conhecidas e identificadas no mundo. Destas, porém, menos de 200 são vínicas, ou seja, se prestam à vinificação, ou por outra, se dão ao seu mais nobre fim.

São “vitis viniferas”, são “vitis lambrusco”, são “octoctones”, são “clones”, são em fim das mais diversas classificações, e muitas vezes com nomes que chegam a assustar: Tinta Cão, Tinta Caiada, Airén, rkatsiteli ou xynomavro.

São tantas que se criou uma ciência para se tratar do assunto, a AMPELOGRAFIA: é a ciência de identificar e descrever uma videira, de modo a diferencia-las uma das outras estudando e medindo sarmentos, caules, botões, flores, cachos, sementes e uvas.

Com a propagação pelo mundo da enocultura, algumas destas uvas foram naturalmente ganhando o status de “clássicas”, enquanto muitas outras continuaram no quase ostracismo. O que define uma variedade clássica é, em primeiro lugar a manifestação de qualidade da mesma por um longo período de tempo e por diversas regiões.

Algumas se destacam demasiadamente, com facilidade, em razão de sua onipresença por todo o mundo produtor e consumidor de vinhos, e consequentemente pela marca que deixam nos paladares e olfatos dos degustadores de vinhos por todo o globo.

Não é novidade para ninguém, pois, nem mesmo para o “cervejeiro” ou o “dileto sócio do clube do wisky”, beber um Cabernet Sauvignon ou um Merlot, ou por outra um Chardonay ou um Sauvignon Blanc, já que estas são certamente as castas mais universalizadas do mundo atual.

Cada vez mais comum e possível, ainda, ouvir comentários sobre o Syrah (ou Shiraz), além do Camenere, o Malbec ou até o Tannat.

Outra história, porém, é ouvir alguém comentar sobre o charmoso Torrontés, ou o profundo Teroldego que provaram nos últimos dias.

Em tempos outros, quando a imensa maioria dos vinhos eram produzidos a partir de “cortes”, ou seja, a partir da mistura de duas ou mais castas (às vezes muitas), não se ouvia falar destes inumeráveis nomes, por vezes impensáveis, de castas vínicas a não ser das já mencionadas castas clássicas. Tudo isso graças à moda atual de se produzir vinhos quase sempre “varietais”, ou seja produzidos a partir de uma única casta de uvas.

PERIGO. Com tudo isso, a dificuldade ainda pode ser bem ampliada, especialmente para o “somelier da esquina”: aquele que cheira a rolha e diz que o vinho mostra “nuances balsâmicas”. Ocorre que muitas castas adotam nomes diferentes em regiões diversas, sem nem por isso, é claro, deixarem de ser a mesma casta de uva.

Ao norte de Portugal uma importante casta se destaca em vinhos elegantes com o nome de Tinta Roriz, enquanto no Alemtejo, ao sul daquele País, uma importantíssima casta que produz vinhos encorpados e saborosos se denomina Aragonês, quando na verdade trata-se da mesma uva, que aliás, torna-se a mais plantada uva tinta da Espanha, atendendo porém pela alcunha de Tempranillo.

A fantástica e muitas vezes impagável Pinot Noir da Borgonha, região francesa produtora de alguns dos melhores e mais caros vinhos do mundo com exclusividade desta casta, pode surpreender com seus inesperados aromas achocolatados quando emterras da bota é chamada de Pinot Nero, ou ainda apresenta um acentuado amargor quando na Alemanha é conhecida por Spatburgunder.

A emblemática americana Zinfandel , produz saborosos vinhos na Itália com o nome de Primitivo, e na verdade ambas surgiram posteriormente à Plavac Mali da Croácia, todas na verdade a mesma casta de uva.

Os exemplos continuam por desfilar diante dos olhos dos apreciadores mais atentos: Nero d’avola pode ser Calabrese, Perequita é Castelão, Albarino na Espanha se transforma em Alvarinho em Portugal, a poderosa Malbec em certas regiões da França é conhecida por Auxerrois, e assim por diante.

“Gafes vínicas” à parte, o importante é não ter pressa para se dominar o assunto e ter sempre em mente que o principal é apreciar um vinho que se goste, que nos agrade e é só bebendo-os que os conheceremos, portanto: SACRIFIQUEMO-NOS pela evolução dos nossos conhecimentos ênicos e bebamos cada vez mais e melhores vinhos.

Alexandre Franco

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